terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Amor baseado em evidências

Jornal Folha de SP - Equilíbrio - 31.01.2012

Amor baseado em evidências

Antes de apelar para o jogo de búzios ou para o horóscopo, dê uma olhada na maneira científica de encontrar seu grande amor; quem sabe dê certo

JULIANA VINES
DE SÃO PAULO

A ciência ainda não encontrou a fórmula do amor, mas muitos pesquisadores parecem acreditar que estão quase lá. Estudos, equações e teorias solucionam dilemas como prever a chance de uma reconciliação ou de encontrar a alma gêmea.

Para a médica inglesa Luisa Dillner, as respostas das pesquisas são mais confiáveis que conselhos de amigos. Dillner é colaboradora da revista científica "British Medical Journal" e autora do livro "Os Números do Amor" (Best Seller, 304 págs., R$ 29,90).

"Conselhos são baseados em experiências. A experiência do outro pode bem ser diferente da sua. Já pesquisas são feitas com centenas de pessoas", disse à Folha.

Por exemplo: um amigo pode dizer que a ex-namorada vai pedir para voltar, mas estudos mostram que a chance de reconciliação para casais com menos de 30 anos é de 10%. "Se você sabe que a estatística está contra você, vai se mexer mais rápido."

'ACHISMOS'

O psicólogo Ailton Amélio, professor da Universidade de São Paulo e autor de "Relacionamento Amoroso" (Publifolha, 304 págs., R$ 27, 92), tem estudos sobre o amor, mas é mais cauteloso. "Existem pesquisas confiáveis, mas ainda há muito 'achismo' e soluções mágicas."

Outro porém é que dificilmente os estudos podem ser generalizados. "Muitos são com universitários americanos, nem sempre os resultados se aplicam a outros contextos", diz Dillner.

Para o psiquiatra e terapeuta de casal Luiz Carlos Osorio, não dá para desconsiderar a ciência mas também não tem como ignorar a experiência e o contato com outras pessoas.

"Não podemos reduzir tudo a um padrão. Relacionamentos são imprevisíveis. Existem caminhos para deixar a relação mais satisfatória, mas eles só vão funcionar se o casal se dispuser a isso."

(COLABORARAM FERNANDA REIS E FILIPE OLIVEIRA)

1- COMO PROCURAR SEU PAR

Para a ciência, não há mistério. Diferentemente do que se imagina, homens e mulheres buscam as mesmas coisas em um parceiro. De acordo com levantamento internacional realizado com 9.474 pessoas em 33 países, todos procuram bondade, inteligência, bom humor e saúde na outra pessoa ("Journal of Cross-Cultural Psychology"). Não ajudou? Entãotente procurar pessoas semelhantes a você. Casais com personalidades parecidas são mais satisfeitos em seus relacionamentos, segundo pesquisadores da Universidade de Iowa (EUA). Em estudo de 2005, eles pediram a 291 casais que respondessem a questionários e participassem de interações filmadas. Depois, mediram a satisfação matrimonial e as semelhanças entre os parceiros. Resultado: os casais se parecem muito no que diz respeito às atitudes. As semelhanças na personalidade foram importante para a qualidade da relação.

2- CANTADAS QUE FUNCIONAM

Romantismo à parte, para a psicologia evolutiva, a cantada é o momento de o homem mostrar suas qualidades como bom reprodutor e companheiro. As melhores cantadas, portanto, são aquelas que exibem esses atributos, de acordo com pesquisa da Universidade de Edimburgo, Escócia. Foi pedido a 195 universitários que dessem uma nota de um a cinco para 40 cantadas masculinas. Quanto maior a nota, maior a chance de a conversa continuar. As que tiveram mais sucesso foram aquelas em que o galanteador demonstrava disposição de ajudar ou expunha suas qualidades intelectuais. Quando um homem impediu que roubassem o lugar de uma mulher na fila do ônibus, por exemplo, recebeu nota 3,83. Demonstrar que tem dinheiro também funciona: pedir opinião para comprar um relógio caro recebeu a nota 3,76. As que tiveram as menores notas foram as diretas, como convites explícitos ou elogios. Se você costuma perguntar, sem sucesso, "Você se machucou quando caiu do céu?" (nota 1,54), agora sabe o que está dando errado. A pesquisa foi publicada na revista "Personality and Individual Differences", em 2006.

3- ESCOLHER A ALMA GÊMEA

Quando você está apaixonado, como saber se outra pessoa que você ainda não conhece seria capaz de despertar sentimentos mais profundos? Para solucionar o problema, o matemático e psicólogo Peter Todd, da Universidade Indiana (EUA), junto com o psicólogo Geoffrey Miller, criaram uma teoria que pode ser chamada de "regra dos 12". É um algoritmo matemático, "que maximiza as chances" de achar a alma gêmea e "diminui os riscos" de se dar mal na escolha. A ideia está baseada em um conceito chamado de "satisficing" (a mistura de satisfação com suficiente), que quer dizer fazer a melhor escolha dentro de opções limitadas. Doze pretendentes são uma boa amostra, segundo estimativas dos pesquisadores. Para dar certo, porém, é preciso conhecer bem as opções. E, depois de chegar à conclusão, ter cara de pau para correr atrás de "ex" e pedir uma segunda chance.

4- SEXO NO PRIMEIRO ENCONTRO

Tanto faz se é homem ou mulher: quem tem relações sexuais com quem acabou de conhecer fica malvisto. Trabalho da Universidade Texas Tech (EUA), publicado pela revista "Personal Relationships", entrevistou 296 universitários, que responderam a questionários sobre o comportamento sexual de homens e mulheres tendo como base situações fictícias. Homens e mulheres que tinham sua primeira relação sexual após firmar um compromisso foram considerados mais apaixonados e companheiros. Enfim, desejáveis para um namoro ou casamento. Outra pesquisa, publicada no mesmo periódico em 1998, mostra que homens tem 40% mais chances de se envolver em sexo casual. Ter tido uma experiência desse tipo no passado ou estar em uma situação que favorece o sexo (estar bêbado, por exemplo) aumenta as chances de a transa acontecer. Participaram da pesquisa 305 pessoas -33% dos homens e 16% das mulheres já tinham feito sexo casual.

5- FAZER A PAIXÃO DURAR

O matemático e psicólogo John Gottman, da Universidade de Washington (EUA), depois de acompanhar casais por anos, criou uma fórmula de sucesso para casamentos: a taxa 5 X 1.Para cada coisa (comportamento ou memória) negativa do parceiro, é preciso ter cinco positivas. A teoria da satisfação pode até parecer óbvia, mas a ideia é que os pontos negativos sejam reconhecidos e, quem sabe, evitados. Queixas sobre defeitos na personalidade do parceiro e declarações de desprezo são exemplos de comportamentos nocivos. Um dos estudos de Gottman começou em 1983, com 79 casais que participaram de conversas filmadas. A partir da ideia do 5 X 1, os pesquisadores conseguiram prever a maioria dos divórcios -dos 79 casais, 22 (27,8%) se divorciaram depois de 14 anos. A pesquisa foi publicada na revista "Journal of Marriage and the Family", em 2000. Uma maior capacidade de resolver conflitos e de cultivar memórias positivas ajuda a manter a satisfação no relacionamento. Segundo o pesquisador, há dois períodos críticos: os primeiros sete anos -quando metade dos divórcios acontece- e na meia-idade, em que a satisfação matrimonial chega no ponto mais baixo.

6- RELACIONAMENTO NO TRABALHO

O trabalho é um dos lugares mais citados na literatura científica como um local propício para encontrar o amor. Mas depende do emprego. Ambientes mais liberais, em que piadas são permitidas, são os mais favoráveis para os romances, segundo pesquisa da Universidade de Tulsa (EUA), publicada no "Journal of Applied Social Psychology", em 2011. O estudo envolveu 293 pessoas e foi feito em duas etapas. Os participantes responderam a um questionário que trazia perguntas como "Você já testemunhou um namoro no seu trabalho atual?" e "Você já se envolveu com alguém do escritório?". Dos entrevistados da primeira etapa, 35% já tinham se relacionado com alguém do trabalho. O número chegou a 43% entre os participantes da segunda etapa. Trabalhar nas mesmas tarefas e conviver em um ambiente liberal ajudam. A proximidade física é o que menos conta.

7- REACENDER A CHAMA

A qualidade do relacionamento é ligada à frequência das relações sexuais, de acordo com estudo da Universidade Estadual da Geórgia, publicado em 2008. O problema é que, ainda segundo a pesquisa, na maioria dos relacionamentos a atividade sexual diminui com o tempo. Os cientistas entrevistaram 77 pessoas que estavam em um relacionamento sem sexo para entender o "celibato involuntário" -quando um dos parceiros não tem interesse sexual. Esse celibato pode ocorrer, por exemplo, por problemas no relacionamento ou falta de desejo sexual e pode trazer frustração, depressão e baixa autoestima (94% dos participantes do estudo desejavam ter sexo de novo em suas vidas). A pesquisa não ensina a reacender a chama, mas traz algumas pistas: as principais causas da perda do interesse sexual são a sensação de que não há mais novidade e que não é preciso investir na relação. Outro estudo, canadense, feito com 99 pessoas, mostrou que conversar sobre sexo e falar sobre as preferências na cama pode melhorar a vida sexual.

8- NAMORO A DISTÂNCIA DÁ CERTO?

Estudos mostram que relacionamentos a distância podem ser mais estáveis do que os próximos. Segundo pesquisa da Universidade Estadual de Ohio, feita em 2007 com 122 casais, a idealização do parceiro e a satisfação com a comunicação são maiores em relações a distância. E o que acontece quando os casais que moram longe passam a viver perto? O mesmo grupo de pesquisadores realizou, em 2006, um estudo para descrever as mudanças que a relação sofre quando deixa de ser a distância. Foram selecionados 335 universitários para responder a questões abertas sobre a relação. Os resultados não foram muito animadores: 36,6% dos que estiveram em um relacionamento a distância e passaram a morar no mesmo lugar terminaram em até três meses e 97% deles perceberam alguma mudança na relação, como aumento nos conflitos, ciúmes e percepção de novos defeitos ou qualidades no parceiro. A maioria dos participantes (85%) disse sentir falta de pelo menos uma coisa na relação a distância -autonomia, por exemplo.

9- DISCUTIR SEM COBRANÇAS

Discussões são inevitáveis e, de acordo com a ciência, dizem muito sobre a qualidade do relacionamento. Um trabalho da Universidade de Wisconsin (publicado em 2000 pelo "Journal of Marriage and Family") entrevistou 97 casais recém-casados com, em média, 25 anos. Dois terços deles foram convidados a participar de interações em laboratório. A ideia era observar como eles discutiam e como reagiam a respostas hostis e tentativas de terminar a conversa. Os resultados contrariaram alguns estereótipos de gênero: homens que evitavam conflitos e se retiravam da discussão (mudando de assunto, por exemplo) foram bem vistos pelas mulheres. A atitude foi vista como um empenho do marido em evitar a briga. Já entre os homens, esposas que fugiam de discussões foram motivo de queixa. Segundo a pesquisadora, o estudo mostra que é possível identificar comportamentos que são hostis e, assim, evitá-los. Mas nem todos os conflitos podem ser resolvidos. Pesquisa de 2009, publicada na revista "Family Relations", feita com 100 homens e 100 mulheres casadas, mostrou que as discussões sobre dinheiro são umas das mais frequentes. E elas nunca têm solução.

10- AS CHANCES DE RECOMEÇAR

O fim de um relacionamento não significa um ponto final na vida amorosa, mostra estudo realizado pela Universidade de Essex (Inglaterra). A partir de dados de pesquisas do "British Household Panel Survey", que entrevista anualmente 5.500 famílias, foi possível concluir que, entre as pessoas que acabam de se divorciar, 30% passam a viver com outro parceiro em um ano. Em cinco anos, a porcentagem é de 47%. Porém, a velocidade em que a pessoa inicia um novo romance diminui à medida que ela envelhece. Viúvos e responsáveis por crianças se envolvem 15% menos em novos relacionamentos. E esses relacionamentos pós-rompimento podem ser duradouros? Pesquisas já disseram que há um risco de "efeito rebote" (usar um amor para curar outro), mas um estudo publicado no "Journal of Divorce and Remarriage", em 2011, com dados de 13 mil pessoas, mostrou que a quantidade de divórcios dos "relacionamentos-rebote" é a mesma de outros tipos de relacionamento: 15% dos casais que recomeçaram acabaram se separando. O trabalho analisou relacionamentos que começaram em vários períodos pós-separação e não encontrou diferenças.

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